Antevisão Etapa 20 — Tour de France

The Tour de France is not over. Felizmente, já não temos de levar com os dois do costume. Venham de lá os fugitivos.

Antevisão Etapa 20 — Tour de France
Tour de France

Rescaldo da Etapa 19

Uma coisa é certa: este Tour pode não ter tido grande suspense ao nível do desfecho do vencedor final, mas drama, ó ó, drama do bom, enredo telenovelesco, lá isso não nos tem faltado. Quando os alienígenas que mandam nisto tudo escreverem os relatórios deste seu novo teste ao planeta Terra e aos seres humanos, esta etapa 19 do Tour de France 2025 vai lá constar como "a etapa do amuo de Tadej Pogačar" — na verdade, ao nível das declarações, este Tour tem-nos revelado uma espécie de nova personalidade do esloveno: bastante provocador, meio mete-nojo, tacadas e bitaites sobre as tácticas alheias, dá para tudo; mas isso levar-nos-ia, provavelmente, a muitas linhas de texto e eu estou cansado, é sexta-feira, e quero ir dar amor à minha filha. Quanto ao amuo de Tadej, já lá vamos.

Antes disso, esta etapa de La Plagne também pode ficar conhecida como "a etapa em que Roglič provou que já passou de prazo e não quer saber se tem um colega de equipa com o pódio em perigo e que bem agradeceria uma ajuda". Talvez demasiado longo para subtítulo, mas eu defendo que um bom título longo é sempre melhor que um título curto e ambíguo. E é preciso admitir: o homem pelo menos tentou. Lançou-se na primeira subida do dia, no Col du Pre, juntamente com Valentin Paret-Peintre e Lenny Martinez — fica a nota que a etapa foi encurtada para 93 quilómetros (ao invés dos 129,9 iniciais) devido a um doença infecciosa que obrigou ao abate de muito gado bovino na zona da descida do Col des Saises, pelo que por uma questão de respeito, a mesma foi retirada do percurso).

O experiente Roglič lançou-se depois sozinho, começou La Plagne na frente, última subida do dia e última chegada verdadeiramente dura do Tour. Mas depressa começou a fazer marcha-atrás, estava vazio e provavelmente pouco interessado se fazia quinto ou oitavo na geral (posição que agora ocupa). É impossível não criticar alguém que com tanto palmarés, aos 35 anos, arrisca tudo para fazer um pódio no Tour, lugar onde estava e está, felizmente, — de outra forma o esloveno ficaria ainda pior na fotografia — Florian Lipowitz, seu colega de equipa. A crítica, entenda-se, não é a esse risco, é antes que por esse motivo não foi útil a Lipo, que partiu para esta etapa apenas com 22 segundos de vantagem para Oscar Onley. A mensagem foi clara: eu não trabalho para ninguém. Porquê? Porque posso. E isso, para um corredor da sua dimensão, não lhe fica lá muito bem. O que vale é que não foi preciso.

Continuamos La Plagne acima. Bem cá de baixo, a coisa de 14kms da meta, numa subida com 19, Pogačar ataca. O grupo parte-se, Vingegaard responde prontamente. E um novo player entra em jogo. Thymen Arensman aproveita as indecisões dos dois da vida airada para se adiantar, com aparente autorização de Pogi — já que Ving não passou uma única vez pela frente, o que também é bastante ousado para alguém que no dia anterior tinha dito "The Tour is not over". Ganhou 30 segundos e a diferença andou sempre por ali, com o mundo inteiro a pensar que bastaria o esloveno levantar-se do selim para aquele meio minuto virar poeira.

Os quilómetros foram passando e ainda que o tempo tenha sido recortado enquanto se aproximavam da meta — em grande medida cortesia de Florian Lipowitz que vendo Onley ceder decidiu aumentar o ritmo para se distanciar na geral do britânico —, a verdade é que nunca mais lá chegavam. E nunca mais lá chegaram. Pogačar limitou-se a seguir a ritmo, não se levantou da bicicleta e Vingegaard não se mexeu até aos últimos cerca de 300 metros, quando, estupidamente tarde, percebeu que o esloveno não ia mexer e, assim sendo, deixa-me lá ver se ainda consigo ganhar a etapa, esse desejo incrível, esse grito arriscado, esse objectivo que ontem me fez dizer que o Tour ainda não estava acabado.

Diga-se o que se disser, mas que ninguém tire o super Tour, a super forma que vive Thymen Arensman. Enorme talento. Agora só falta ir para uma boa equipa (fotografia: X Tour de France.)

Qual deles o pior? Escolham vocês. O camisola amarela teve o desplante de dizer, no final, que Arensman atacou no momento certo e que ele decidiu não seguir, preferindo subir a ritmo. No entanto, manteve o neerlandês sempre a 30 segundos, numa nítida declaração de interesse na etapa. Deve ter sido já no último quilómetro, ou na aproximação ao mesmo, com a postura ultra-defensiva de Vingegaard, que Pogi decidiu que não ia fechar o espaço. Por um lado, porque se o dinamarquês queria ganhar a etapa que fizesse por isso, por outro, porque talvez tivesse medo de perder no mano-a-mano e assim, pelo menos, não ganhou Vingegaard, ganhou Arensman. Agora, digam lá que isto não dava uma bela produção da TVI. Luís Esparteiro, naturalmente, no papel de Pogačar.

O percurso

Ora bem, a alta montanha acabou, mas isso não quer dizer que esta etapa 20 não traga algumas dificuldades.

Nantua-Pontarlier (184.2kms)

Uma terceira categoria bem longa logo a abrir, seguida de uma enorme descida e de nova dificuldade de quarta categoria e ainda mais um falso plano que se lhe sucede. É raro encontrarmos terreno plano nestes 184 quilómetros. A grande dificuldade está no Côte de Thésy, um paredão imponente: 3.5kms a 9% de pendente média, com muros bem bem exigentes, situada, no entanto, a coisa de 65 quilómetros da meta. Depois disso, ainda várias dificuldades até ao final, algumas categorizadas, outras nem tanto.

O que esperar

Como todos sabemos, "The Tour is not over", portanto eu espero que a Visma endureça a corrida logo desde cedo, coloque Jorgenson na frente para depois (não) servir de satélite e Vingegaard atacar ali naquela — ok, 'tou a gozar. Wout vai estar na fuga dê por onde der e mais uns quantos Visma também. No fundo, há muita gente que vai querer estar na fuga e com o terreno tão acidentado, prevejo que a formação da mesma seja longa e dê grande espectáculo no início da tirada.

O facto de não existir plano parece-me que torna impossível a chegada em sprint, a isso acrescenta-se o facto de muitos dos homens rápidos estarem exaustos depois de tanta montanha nos últimos dias. Isto tem fuga escrito na testa. E como a geral está arrumada, há festa para todos, diria. O pódio, que parecia ser a questão mais complicada de arrumar, teve hoje um provável ponto final, tendo em conta que esta etapa 20 não tem dureza suficiente para Onley atacar Lipowitz com sucesso, o que não quer dizer que não tente. Acho pouco realista que o faça, o quarto lugar não deixa de ser um grande resultado para o corredor da PicNic e não se pode dizer que não tenha tentado chegar ao pódio.

Como em qualquer fuga, já sabemos, é a lei do mais forte, ou pelo menos a lei do mais inteligente. Se tivermos chegada em grupo reduzido, ganha o mais rápido do lote ou aquele que mais roda chupou durante grande parte da etapa. É simples. O que me parece evidente é que sem geral ao barulho, esta pode ser uma etapa bem divertida de seguir.

Não há Favoritos, malta, há Fugitivos com muita sede

Wout van Aert — Ele já tentou tudo. E amanhã vai tentar novamente. Pelas suas características, tem aqui uma bela hipótese. Mas também me parece que se estiver na fuga no Côte de Thésy, toda a gente vai querer deixá-lo para trás.

Quinn Simmons — Tenho de admitir que está a fazer um super Tour. Espero que não ganhe, claro. Normalmente, não gosto que nada de bom aconteça a apoiantes de Donald Trump. É só por isso.

Victor Campenaerts — É claro que ele vai tentar. E merece. Pelo trabalho. E pela voz de desenho animado que é a minha preferida de todos os tempos. (Sim, mais do que a voz de Johnny Cash.)

Romain Grégoire — Primeira semana andou por lá, depois andou em Nárnia. Pode ser que já tenha regressado.

Julian Alaphilippe — Às vezes, é preciso vencê-los pelo cansaço.

Iván Romeo — A Movistar precisa. E se calhar, desta vez, Nils Politt deixa.

Jhonatan Narváez — Foi o melhor gregário de Pogi. Merecia a vitória. Mas pode estar demasiado cansado. Ou Pogi pode dizer que precisa dele, que se sente mais seguro, que ele tenta depois na subida de Montmartre.

Alex Aranburu — Está lá? Está aí alguém?

Jenno Berckmoes — 'Tou, sim, diz, como é que é? Vamos lá hoje ou não?

É dia de fuga. Podiam estar aqui 30 nomes. Um desses louquitos da EF. Os armários noruegueses da Uno-X. Os desesperados das equipas francesas. O Nys. O Skujiņš. Toda a Movistar incluindo Cortina. A Astana em ácidos. Dá para tudo. Não me peçam para saber quem vai ganhar.

Apostas falso plano

André Dias — Alguém sabe se o Ivan Roméo ainda está em prova?

Fábio Babau — O Bau está num jantar, por isso aposta Alaphilippe. Se o LouLou ganhar, o Bau promete beber uma aliança velha, aquecida em copo de balão, de pénalti, durante o dia de amanhã. O vídeo publicado nas redes, naturalmente.

Henrique Augusto — https://www.falsoplano.pt/allez-loulou-mon-amour/.

O Primož do Roglič — O meu coração pede Roglič.

Miguel Branco — Desde que não ganhe o Simmons, eu fico contente. Se tiver de dizer alguém: Emiel Verstrynge.

Miguel Pratas — O Pratas disse que se ia pirar. O que pode significar que está em Miami ou na Golegã, nunca sabemos, é assim a life dos digital nomads. Por isto tudo, aposta no Connor Swift.

Nuno Gomes — O Nuno? Bom, o Nuno, se bem o conheço, deve estar a estudar o histórico de tempos do Côte du Fourneau Saint Michel, primeira categoria que pode ser decisiva amanhã na primeira etapa do Ethias Tour de Wallonie. Mas ele há três dias confessou-me que tinha quase a certeza que esta chegada a Pontarlier era para Pascal Eenkhoorn. Vamos ver.

Rogério Almeida — Com ou sem motas: Simmons.