Antevisão Etapa 8 — Giro d'Italia
Chega o dia da fuga. Está uma etapa e uma camisola bonita, assim rosinha, em jogo.

Rescaldo da Etapa 7
Chegámos então finalmente ao primeiro confronto entre os candidatos à vitória final na GC da Volta a Itália. O dia que viria a terminar em Tagliacozzo arrancou desde logo a subir, entregando uma já expectável boa luta pela formação da fuga do dia. Quando o primeiro grupo se constituiu, vimos uma Red Bull BORA a puxar a fundo devido à presença de Jay Vine na frente (apesar de já estar longe na geral, a equipa de Roglič não queria nenhum UAE na fuga). Voltámos então a ter um pelotão grande, Fortunato aproveitou para ir buscar uns pontinhos da montanha, e estavam reunidas as condições para se formar uma fuga já do agrado de toda a gente.
Foi uma fuga sem grandes nomes e que somente durante alguns momentos sonhou com a possibilidade da vitória, já que quando a Lidl-Trek se juntou à Red Bull na perseguição o desfecho ficou evidente. Pelo caminho, Paul Double mostrou boas pernas e venceu os sprints pela montanha e Nicolas Prodhomme deu a entender que tem capacidade para voltar a andar em fugas perigosas neste Giro. Christian Scaroni pareceu sempre uns furos abaixo ainda daquilo que sabemos poder dar. A fuga viria a ser alcançada na entrada para os cinco quilómetros finais, mas não sem antes de se dar uma desgraça francesa. Tanto Romain Bardet como David Gaudu caíram e andaram a perseguir o pelotão, conseguindo alcançá-lo mas gastando forças que os impossibilitaram de ter uma boa prestação na etapa e os afastaram bastante da luta pela classificação geral. Sobram etapas para tentar vencer, boas noticias para todos, penso eu.
A subida final tinha 11 quilómetros de extensão mas só nos últimos 3 é que a coisa apertava a sério. Quem assumiu as despesas na fase inicial da zona dura foi a Bahrain, impondo um ritmo altíssimo para testar os rivais de Damiano Caruso e Antonio Tiberi. Destacar aqui o ótimo trabalho do português Afonso Eulálio, que foi quem deu o último kick antes de se iniciarem os ataques.
O primeiro a atacar, quando faltavam cerca de 1500 metros para a meta e o "pelotão" não deveria ter mais que 20 unidades, foi Giulio Ciccone. Carapaz seguiu, Arensman também fez a sua tentativa mas foi Egan Bernal quem, a 700 metros da meta, deu a impressão de poder vencer. Impressão errada, pois apareceu um Juan Ayuso, que até agora tinha estado discreto, a passar por toda a gente de mota e a vencer com 4 segundos de vantagem, estreando-se a levantar os braços em Grandes Voltas.
Ao espanhol seguiu-se um super Isaac Del Toro e um incrível Egan Bernal. Primož Roglič ascendeu à primeira posição da geral apesar do dia menos bom, já que à partida era o favorito para esta etapa que no papel tão bem lhe assentava. Ninguém, dos potenciais top-10, perdeu tempo significativo, com 25 ciclistas a chegarem a menos de 1 minuto.


O percurso
Mais uma etapa estranha com montanhas a sério em sítios onde as mesmas não fazem sentido nenhum. Signore Vegni, repita comigo:

Um inicio de etapa bastante acidentado, sem grandes subidas mas com ainda menos metros planos levam-nos até Sassotetto, que é uma subida bem dura (13km @ 7.3%) mas mal acompanhada pelo que vem a seguir. Há a subida a Montelago (5.5km @ 6.9%) a deixar os ciclistas 50 quilómetros da meta e depois três pequenos topos muito explosivos já nos 20 quilómetros finais. O último dos quais (Gagliole — 0.8km @ 8%) é a meros sete quilómetros da chegada, sendo essa aproximação feita em descida até um quilómetro final em plano.

O que esperar
Há duas leis do ciclismo que são importantes conhecer para compreender os próximos tempos deste Giro. 1) Quando não há Pogačar a UAE não é bem uma equipa, é só um conjunto de ciclistas que calha usarem o mesmo equipamento e 2) Roglič odeia cerimónias e atenções, pelo que se tem a camisola rosa o primeiro desejo dele será livrar-se da mesma para alguém que não assuste.
Dada a minha confiança nesta segunda regra, tenho plena crença que amanhã será finalmente dia para a fuga vingar. Vamos ter uma luta duríssima e acredito que apenas no Croce di Casale (8.6km @ 4.5%) se forme a fuga definitiva do dia, já com cerca de 60 quilómetros de etapa percorridos. A grande questão do dia é mesmo quem irá estar nesta fuga. Há alguns atacantes que todos esperamos ver lá, mas o realmente importante para compreender como a etapa se vai desenrolar é perceber se algum borderline GC guy se vai tentar intrometer. Aqui refiro-me a nomes que estão perto o suficiente para poderem ficar com a rosa mas que não assustam a sério Roglič. Há muita gente ali a menos de 2 minutos que pode ser apetecível, como McNulty, Vacek, Caruso, Harper, Rubio, Gaudu, Piganzoli e Pidcock. Depois um pouco mais longe há outros nomes que poderão chegar à rosa, como Poels, Cepeda e Cattaneo. Será muito interessante o inicio da etapa e ver como todas estas dinâmicas se conciliam, com muitas equipas a verem uma ótima oportunidade não só de vencer como de chegar à rosa.
Formada uma fuga que agrade ao pelotão, será então na frente que se disputará a etapa. Uns estarão 100% focados na etapa, outros meio na etapa meio na geral e outros estarão meramente em trabalho para os seus líderes. Nas duas principais subidas será feita a seleção sobre quem pode disputar a etapa, mas acredito que seja num ataque "surpresa" que vá surgir o vencedor final, aproveitando depois alguma desorganização típica da perseguição.
Entre os GC, não acredito que existam quaisquer movimentações ou diferenças relevantes.
Favoritos
Davide Piganzoli — É o candidato ideal para assumir a rosa no fim do dia de amanhã. Será, quase de certeza, o melhor colocado dos homens da fuga — é atualmente 12.º a 43 segundos — mas não assusta para as três semanas. Se Roglão deu cinco minutos ao O'Connor, a Piganzoli também não deverá ter problemas em dar. Isso pode custar-lhe algumas hipóteses de vencer a etapa mas eu acredito na capacidade do italiano conciliar os dois objetivos. E era bonito, não me lembro da última equipa italiana a liderar no Giro.
Wilco Kelderman — O homem nunca ganhou no WT, apesar da sua tremenda qualidade. Houve sempre alguém mais forte quando lutava pela GC e o resto do tempo estava ao trabalho. Pois desta vez não deverá ficar preso a Simon Yates e não está na luta pela GC, pelo que deverá ter liberdade total e eu gostava de o ver ganhar. É um ótimo trepador e tem bom kick, duas características essenciais para estar na disputa desta etapa.
A não perder de vista
Pello Bilbao — Ou ele está mesmo muito mal ou anda-se a poupar para atacar uma etapa deste género. É perito em fugas e sobe/desce/sprinta muito bem. Já perdeu muito tempo na GC e amanhã Tiberi não deve precisar dele, o Eulálio fica a tomar conta do italiano.
Luke Plapp — Gosta deste tipo de terreno acidentado e beneficia do facto da montanha realmente dura estar ainda muito longe da meta. Não tem nenhuma vitória em corridas a sério e eu estou com vibez que amanhã é dia de estreia para alguém.
Filippo Fiorelli — É versátil, entrou muito bem neste Giro e tem uma ótima ponta final. Não o vão querer levar para a meta.
Wout Poels — Primeira oportunidade para completar a sua tão ambicionada trilogia de vitórias nas grandes voltas. Tem mostrado boas pernas e tem um race sense extraordinário, pelo que corridas caóticas como a que espero amanhã são a sua praia.
Brandon Rivera — Entrou muito bem neste Giro e a sua versatilidade e punch podem ser muito úteis amanhã.
Mathias Vacek — Apontado por muitos como o favorito dada a forma extraordinária que tem demonstrado. E que merecido seria, depois de tão fundamental ter sido no grande início da Trek em Itália. Eu acho que vai acusar o cansaço de andar sempre a fundo enquanto os seus colegas de fuga se pouparam mais para este dia mas não quero arriscar deixá-lo de fora.
Apostas falso plano
André Dias — Scaroni. O Bau precisa.
Fábio Babau — Lorenzo Fortunato. Eu preciso.
Henrique Augusto — Piganzoli de Maglia Rosa era uma imagem bonita e eu sou um homem romântico.
O Primož do Roglič — Amanhã é dia de fuga. Lorenzo Fortunato rumo à montanha.
Miguel Branco — Mads Pedersen. Já hoje devia ter ganho.
Miguel Pratas — Frigo.
Nuno Gomes — Zambanini em fuga... Porque os ativistas descansam ao sábado.
Rogério Almeida — Pedersen em recuperação ativa.