Antevisão — Tour de Suisse
Heidi, Milka, canivetes, relógios e João Almeida. A neutralidade não é para aqui chamada.

Introdução
Nós gostamos da Volta à Suíça e a Volta à Suíça gosta de nós. Nós, portugueses, naturalmente, não estou a dizer que a prova tem um fraquinho pelo falso plano até porque não há dados que o permitam concluir. Certo é que todos recordamos aquele hattrick maravilhoso de Rui Costa entre 2012 e 2014. E se o ano passado o João Almeida deixou Adam Yates vencer, este ano a conversa é outra, este ano é bota lume para cima deles.
Como toda a gente a sabe, todos aqueles que podiam dar luta a João Almeida na classificação geral fugiram para o Dauphiné com medo do português. Por isso, segurem-se bem, a vitória adivinha-se e assim Almeida pode cumprir um feito inédito: vencer três provas por etapas World Tour no mesmo ano e de forma consecutiva — e logo três das sete mais prestigiadas. Se retirarmos o factor sequencial, já Bradley Wiggins (2012) e Sean Kelly (1986 e 1984) tinham conseguido erguer os braços em três das sete mais relevantes provas de uma semana do calendário internacional. E convenhamos que Bradley Wiggins, Sean Kelly e João Almeida é um grupo bem catita, um daqueles trios que podem entrar num bar para beber copos e contar anedotas. Um daqueles trios que podem ser uma banda de sertanejo ou estilo musical semelhante.
Convém dizer que Almeida não vai sozinho. António Morgado, Nélson Oliveira e Rui Costa são os outros três corredores lusos à partida. É tudo nosso.

Quanto à competição em si, apresentações dispensam-se. Esta é a 88ª edição da Volta à Suíça. Corre-se desde 1933, transborda história e é normal que durante a próxima semana o nosso imaginário seja invadido por imagens da Heidi, da vaca Milka e por trocadilhos com canivetes, relógios e neutralidade. É a Suíça, minha gente.
O percurso
Etapa 1 — O João Almeida do País Basco, descedor nato, pode vencer aqui. Mas também, convenhamos, é a primeira etapa, não há razões para arriscar e convém dar alguma oportunidade aos outros. Uma coisa é certa: com três quilómetros a 9% a coisa de 15 quilómetros da meta e uma descida que se lhe segue, esta será uma etapa vencida por algum atacante (ou um grupo corajoso que se destaque). Jan Christen? Matteo Sobrero?

Etapa 2 — Primeira vitória do João Almeida. Estou a gozar. É um típica etapa helvética: subidas não muito duras, mas talvez exigentes demais para os homens mais rápidos disputarem a vitória. Late attack ou chegada num grupo relativamente curto até porque os últimos metros são em descida.

Etapa 3 — Aqui os sprinters podem tirar o cavalinho da chuva. O final é bem armadilhado, com subidas mais longas e árduas quando comparadas com as do dia anterior. Espero gente com capacidade para subir e com ponta final. Hirschi?

Etapa 4 — Primeira vitória do João Almeida. E agora não estou a gozar. Vamos superar os 2000 metros de altitude, com uma ascensão que se contabilizada a terceira e a primeira categoria tem mais de 12 quilómetros e que na verdade começa antes disso. É um esforço bastante largo. E o João patrão, que domina as corridas, vai querer começar a distanciar-se da concorrência. Depois é descer para a vitória.


Etapa 5 — Segunda vitória para João Almeida. Easy. A subida final à Castaneda é de uma dureza… Quantos minutos ganha o bota lume?


Etapa 6 — Apesar do início bastante atribulado, esta é a melhor oportunidade para uma chegada em pelotão compacto. Os sprinters "só" têm de chegar à etapa 6.

Etapa 7 — Terceira vitória para João Almeida. Ou então, a vantagem já é tanta, que deixa ganhar um colega de equipa. É preciso manter os gregários felizes.

Etapa 8 — E para terminar em grande: cronoescalada. Imaginem bem, uma cronoescalada, um contrarrelógio onde o João Almeida não tem de gerir esforços entre plano e ascensão, é só subir, é só ir a fundo. E logo com esta dureza. Aqui ficam a 7 minutos.

O que esperar não, com quantos minutos ganha Almeida
Acho que aquilo que fui dizendo atrás já sugere qual será o desfecho desta prova. Mas pronto, não quero faltar ao respeito a ninguém. A Red Bull-Bora é provavelmente a formação mais perigosa para João Almeida. Ao mesmo tempo: o seu líder é Vlasov e embora o russo seja um daqueles corredores que anda bem em diversos terrenos, também não tem demonstrado capacidade de se bater com os melhores na alta montanha.
Felix Gall e Michael Woods (Blackmore, Bennett, Riccitello e Froome como gregários não é propriamente de deitar fora) são talvez aqueles trepadores que mais capacidade tenham para perseguir ou atacar o João nesses dias, mas isso não quer dizer que sejam regulares o suficiente para ameaçar o português.
A táctica para todos aqueles que querem sonhar com uma surpresa tem de passar por aí: atacar, atacar, atacar. E isso significa atacar em terrenos menos acidentados, atacar em descidas, atacar em planos, atacar em zonas que possam fazer renascer o antigo João Almeida, mal posicionado no pelotão, que sucumbe a um abanico ou a uma movimentação inesperada. Ou vai lá dessa forma ou não vai de forma nenhuma.
Favoritos
João Almeida — Tenho sempre medo que algo aconteça quando se é ultra-favorito. É um problema que eu tenho. Mas o sotôr Almeida este ano tem tratado de resolver algumas das minhas inseguranças. Agradecido por isso. E, pronto, por toda a descrição acima, João é o evidente e único grande candidato.
A não perder de vista
Aleksandr Vlasov — Ainda está para chegar o bom resultado em 2025. E eu estou com fé que vai ser desta, até porque Vlasa e Almeida sempre gostaram de dar show quando estão mano-a-mano.
Michael Woods — Aos 38 anos é preciso ser-se cuidadoso com as aparições. Isso faz com que a forma do canadiano (que não corre desde a Milano-Torino e onde fez DNF) seja uma real incógnita. Ainda assim, há poucos a subir como ele nesta startlist.
Felix Gall — Agora já não há Ben'O para incomodar, é tudo teu, amigo. O que também significa que está na hora de te chegares à frente. De uma vez por todas.
Oscar Onley — Esperava uma temporada melhor por parte do britânico, sobretudo depois de um arranque interessante no UAE Tour. Ainda assim, tendo em conta os nomes presentes, tem de ser considerado um candidato ao pódio.
Apostas falso plano
André Dias — É líder de equipa, é português, é desta. Força, Rui Costa.
Fábio Babau — Bota Lume.
Henrique Augusto — João Pedro Gonçalves Almeida.
O Primož do Roglič — Sobe, sobe, João sobe. Vai pedir àquela estrela que te deixe lá viver e sonhar.
Miguel Branco — Podemos voltar ao Giro dell'Emilia 2020? Mas desta vez com vitória de Almeida.
Miguel Pratas — Joe Blackmore, em segundo.
Nuno Gomes — É tempo de São João, com montanhas e pedaladas, no crono venha a decisão, tenha as pernas abençoadas.
Rogério Almeida — João, vai ficar feliz, o petiz, a cantarolar.